sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Fala, Fidel

Num artigo intitulado “O papel de bom, à custa de quem?”, divulgado na quinta-feira (17), Fidel Castro destaca que quando o governo dos Estados Unidos ofereceu US$ 100 mil como ajuda frente à catástrofe ocasionada pelo furacão Gustav, com prévia inspeção no local para comprovar os estragos, foi-lhe respondido que Cuba não poderia aceitar doação alguma do país que a bloqueia.

Leia abaixo a íntegra do novo artigo, reproduzido pela Agência Prensa Latina:


O papel de bom, à custa de quem?


Quando o governo dos Estados Unidos ofereceu hipocritamente US$ 100 mil como ajuda frente à catástrofe ocasionada pelo furacão Gustav com prévia inspeção no local para comprovar os estragos, foi-lhe respondido que Cuba não poderia aceitar doação alguma do país que a bloqueia; que os estragos já tinham sido calculados e o que reclamávamos era que não fosse proibida a exportação dos materiais indispensáveis e os créditos associados às operações comerciais.
Alguns no Norte se esgoelaram gritando que a rejeição de Cuba era inconcebível.

Quando o Ike poucos dias depois açoitou o país desde Punta de Maisí ao Cabo de San Antonio, os vizinhos do Norte foram um pouco mais hábeis. Amenizaram a linguagem. Falaram de aviões prontos para partir com produtos no valor de US$ 5 milhões; que não teriam a necessidade de serem avaliados, porque já o haviam feito por seus próprios meios, que não podem ser outros que os de espiar o nosso país. Desta vez sim, pensaram, que poriam a Revolução em aperto; se atreveriam a recusar a oferta, buscariam problemas com a população? Talvez pensaram que ninguém havia visto as imagens divulgadas pela televisão dos Estados Unidos quando as forças de ocupação da ONU distribuíam alimentos no Haiti à população faminta que os disputava através de uma cerca de arame farpado, dando lugar inclusive a crianças feridas.

A fome nesse país é fruto do saque histórico e sem piedade dos povos. Ali mesmo, em Gonaïve, nossos médicos arriscavam sua vida assistindo à população dessa cidade, bem como o fazem em quase cem por cento dos municípios dessa nação. Essa cooperação prossegue ali como em dezenas de nações do mundo, apesar dos furacões. À nova e astuta nota foi respondido categoricamente que: “nosso país não pode aceitar uma doação do governo que nos bloqueia, ainda que está disposto a comprar os materiais indispensáveis que as empresas norte-americanas exportam aos mercados, e solicita a autorização para o fornecimento dos mesmos, bem como dos créditos que são normais em todas as operações comerciais''.

“Se o governo dos Estados Unidos não o deseja fazer definitivamente, o de Cuba solicita que ao menos o autorize durante os próximos seis meses, especialmente se levam em conta os estragos ocasionados pelos furacões Gustav e Ike, e que ainda faltam os meses mais perigosos da temporada ciclônica”.

Não foi feita com arrogância, porque não é o estilo de Cuba. Na própria nota pode-se apreciar como se expressava com modéstia a idéia de que para nós bastava que a proibição fosse suspendida por um limitado período de tempo.

O secretário de Comércio dos Estados Unidos, Carlos Gutiérrez, descartou na sexta-feira (12) que o bloqueio fosse levantado de forma temporária.

É óbvio que o governo desse poderoso país não pode compreender que a dignidade de um povo não tem preço. A onda de solidariedade com Cuba, que abarca países grandes e pequenos, com recursos e até sem recursos, desapareceria no dia em que Cuba deixasse de ser digna.

Equivocam-se rotundamente os que em nosso país se desagradem por isso. Se em vez de cinco milhões fosse um bilhão, encontrariam a mesma resposta. O dano em milhares de vidas, sofrimentos e mais de US$ 200 bilhões que custaram o bloqueio e as agressões ianques, não podem ser pagas com nada.

No relatório oficial parcial foi explicado ao povo que em menos de dez dias o país havia sido afetado em mais de US$ 5 bilhões. Mas também foi explicado que essas cifras eram a preços históricos e convencionais, que nada tinham que ver com a realidade. Não deve ser esquecida nunca a explicação bem clara de que “os cálculos das perdas em moradias são sobre a base de preços históricos e convencionais, e não os valores reais a preços internacionais. Basta assinalar que para dispor de uma moradia duradoura que resista aos mais fortes ventos, requer-se um elemento indispensável que escasseia muito: a força de trabalho. Esta é igualmente necessária para um conserto temporário como para uma construção duradoura. Dita força tem que ser repartida em todos os demais centros de produção e serviços, alguns significativamente afetados, pelo o que o valor real de uma moradia no mundo e a amortização do investimento correspondente é muitas vezes maior.”

O golpe da natureza foi contundente, mas também é alentador saber que não haverá trégua nem descanso em nossa luta.

A crise econômica que atinge os Estados Unidos, e como conseqüência os demais povos do mundo, não tem resposta definitiva; no entanto, sim a têm os desastres naturais em nosso país e toda tentativa de pôr preço a nossa dignidade.

[Fidel Castro Ruz]

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